Esta é para ti, Manel.
(Eu também queria ser ninguém.)
Serei eu, quase homem, adornado de traços fatalistas e depressivos, olhando-te em tudo aquilo que mostras ser, um alguém, um teu contemporâneo, que estará ao teu lado, sendo mais que uma pessoa mais na multidão?
A minha única, nossa, irracionalidade aparente, as curvas do corpo feminino, e nosso pecado, amá-las, às mulheres.
Eu queria gritar as minhas palavras, saber que o mundo sabe quem eu sou, perder-me em copos vazios, escrever tudo isso, em verso, prosa desmedida e despreocupada.
Eu sou isto e nada mais, ingenuidade contrastante á inocência pouca que resta. Isto, e nada mais, como o amor que cantas.
Talvez doa, e dê vontade de não acordar, quando o dia amanhece. Ser poeta não é um dom, é uma infeliz característica do ser. Mas há quem seja masoquista o suficiente para sustentar a dor, e não morder a mão que dá de comer, que é a dor que alimenta e, no fim, conseguir sorrir, ou morrer na ignorância.
Eu queria saber escrever cantigas de amor. Fazer as donzelas corar, olhar-me de soslaio, envergonhadas e apaixonadas. Queria roubar todos os corações com uma rima mais bem conseguida, derreter-lhes os corações com o olhar.
Mas eu não nasci para falar de amor. Nem sequer sei escrever a dor. Serão sinónimos, o amor e a dor? Sou português: falarei de mar e de saudade, de vinho e de tabaco, da terra e do homem que dela vive. Se a dor se intrometer no caminho, menos mal. Com a dor, vem sempre o amor, sem distinguir o ódio da angústia, ou o não querer esquecer, daquilo que nos faz mal.
As tuas canções têm um “travo a tudo o que é mortal”, sublime, transcendente. És génio, aqui tão perto, cá dentro tão longe.
Bebo este copo de vinho, de um trago, que fora a ti brindado.
Obrigado.