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A vida sabe melhor, quando se começa a vivê-la às nove da manhã.
De entre o suor, o gemido.
Da boca para fora, as palavras.
Meu amor, sou apenas responsável pelo meu próprio coração. Se me ofereceste o teu e ele acabou partido, foi burrice tua.
Não devias ter dado, assim, de mão beijada, um orgão tão vital.
Ele sentia-se tremendamente cansado, saturado, daquela cidade e, mesmo assim, ela parecia, ainda, acolhê-lo por entre as ruas sinuosas e os arranha-céus.
Enquanto caminhava, olhava o chão e os próprios pés. Pensava:
- Cada passo que dou, ou foi o destino que o escreveu, ou é a acção da reacção. Só espero que os meus pés me levem onde eu quero ir.
Há-de saber, um dia, que não é a única pessoa assustada com o tamanho do mundo e a pequenez da alma, nem enojada com o comportamento humano.
Levantou agora a cabeça, e olha para as pessoas, apressadas, a apertar os casacos, a consertar os cachecóis, está frio, é Outono, mas ainda não cai neve em Nova Iorque. Passou por um bar, sentou-se na esplanada e pediu um copo de vinho. "Tinto, se puder ser. Se não, traga-me água."
O vinho chegou, e ele brindou.
Brindou à saúde, memória, honra e saudade, que tudo o que lhe restava era o saudoso acto de brindar. Talvez ao mundo, às pessoas, aos padrões quebrados, às letras e aos sons, até aos cabelos ruivos e olhos cor-de-amêndoa, não sabemos.
E, agora, sorri.
Sorri, porque foi masoquista demais para ir ao sabor da corrente e viver dá-lhe prazer.