13º, direito. #1

Passei pelo senhor do bigode da portaria e dei-lhe as boas noites. Nunca trocamos mais que saudações curtas e impessoais. Se algum de nós morrer, tenho a certeza que alguma mágoa ou algum luto há-de ficar, nem que seja de espanto ou arrependimento. O senhor do bigode é o porteiro do meu prédio. Tem os olhos encovados, negros, lânguidos e enfumados e a face cravejada de rugas. Ficou a fumar um cigarro e a ver um jogo de futebol. Eu subi até ao meu andar. O guarda-chuva foi indicando o meu resto, pingando o chão do elevador e do corredor, até à porta de casa. 13º, direito. Pousei as chaves e sentei-me no sofá. Como quem pega numa espada, peguei no auscultador do telefone. Hesitei nos número, mas premi as teclas com convicção e esperei a voz dela com um sorriso; curto e irreal.

 

"Eu amo-te, é essa a diferença entre nós", foi dito às páginas tantas. Um de nós adormeceu a chorar, o outro fumou um cigarro; um fez a barba, bebeu um café, ouviu música. Um deles borrou a maquilhagem e tomou um calmante, mas ambos acordaram com frio.

publicado por Gualter Ego às 20:25 | link do post